terça-feira, 28 de fevereiro de 2012


Como quando me perco. As sensações são maiores do que o real. Elas o ultrapassam, pois são arte, criações baseadas na distorção, a realidade sempre se nos apresenta disforme. Não, na verdade, é condição humana a ignorância. Vemos tão somente vultos, borrões que, no entanto, são sempre baseados no que de fato existe, mas o que existe não vemos. Estamos limitados às sensações que são de uma criatividade ilimitada. O real, através das nossas sensações, se torna também ilimitado.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Escrevo às vezes pela necessidade de escrever. Às vezes pelo peso de me perceber sendo. Pela asfixia de saber que não há nenhuma fonte de expressão suficiente. Outras vezes me pego escrevendo de alegria, de não caber mais no meu corpo e precisar extravasar para fora dele. De me perceber tão intensa e sensitiva a ponto de se fazer necessário a materialização de um momento. Escrevo também por não saber dizer. Escrevo até pela necessidade de potencializar alguma discussão, de visualizar o meu pensamento. Mas escrevo apenas quando quero. Escrevo apenas se preciso. Escrevo somente quando peço. Escrevo só. Escrever é a minha solidão. 

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Como é a sua dor de ser no mundo?  Um corpo recortado e submerso em um todo sem sentido. Um rosto de olhos e boca que se misturam inábeis e fracassados. Como eu me sou em meio a tudo isso? Aglomerado de sensações e movimentos. Esquisitices e afastamentos. Um rosto que se segue em seu descaminho. Na cama desfeita eu me vejo, nos restos das roupas. Naquilo que sobra, no inútil da casa. Nos vãos e nos cantos. Nas sombras.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Sonolência. No entanto nada me tira de mim. Penso sempre e cada vez mais naquele momento em que, ao acordar, abro os olhos lentamente e me invadem mil imagens distorcidas e muito claras. Minhas pálpebras ainda tímidas e incomodadas se esforçam para proteger os meus olhos da luz até o momento em que não há mais escapatória e elas aderem a uma ávida busca por algum ponto que se apresente claramente. 

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Você deveria viver mais, aproveitar mais, me disseram. Repliquei sem pestanejar: Mas de que vida fala você? O que você entende por aproveitá-la? Como poderá saber se, de fato, não sinto toda a vida intensamente pulsando a cada segundo da minha existência? O que te leva a julgar que não posso, dentro mesmo do meu quarto, no interior de cada linha dos meus livros, alcançar as sensações mais sublimes e inteiras, me sentir muito mais excitada e entusiasmada do que você jamais poderia? E, no entanto, de que vida falo eu? O que eu entendo por aproveitá-la? Como posso saber se, de fato, não me perco no escuro e sinto apenas sensações de segunda mão? O que me leva a julgar que posso nas linhas mal lidas dos meus livros me sentir para além do que elas me propõem? É, quem sabe eu devesse viver mais...

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012


Será, será mesmo que não há sequer uma pessoa, um corpo, uma fresta de luz, um zumbido capaz de fazer com que eu possa sair de mim e por um momento docemente deslizar sentindo-me repleta de um outro que inunde a minha escuridão e o meu silêncio? Será possível que não exista uma porção de qualquer coisa que em qualquer tempo me tome pela mão e, sincronizando o ritmo dos nossos passos, me faça sentir parte de tudo o que é? Deve haver em algum lugar um ruído esquisito e perdido a espera de um lugar em que se possa, em paz, repousar.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

...

Literatura é não estar certa nem errada. É não ter nada a ver com o certo e com o errado. É abrir um caminho, ver surgir uma possibilidade. É a produção de um encantamento, de uma constante recriação do que se vê sempre. É poder vislumbrar nos espaços vazios relances do que se tentava dizer. Literatura é nunca chegar lá. É não precisar chegar. É um caminho aberto, alterado, inacabado, que só tem razão de ser porque não é, porque não precisa ser. É saber que nunca se lê de verdade só com os olhos ou com as mãos. Lê-se sempre por toda a parte e com todas as partes do que se é. A literatura é.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

De que vale todo o entendimento, cada gota de suor, cada forma do pensamento se o corpo todo não estiver presente? Se não pudermos sentir a nós mesmos. A aprendizagem é no corpo, é pelo corpo. É só no corpo. Daquilo que não posso sentir também não posso entender.