E eu que não me reconheci depois daquela noite, depois daquele brilho,
daquela suavidade. E eu que fui andando a esmo sem notar as cores, sem tocar as
notas, sem me enxergar. E eu, um pássaro calado sem saber voar. Um vento
irrequieto e louco a procurar o mar. Eu me soltei sem rumo no meio da rua, quis
tocar as plantas, quis saber das letras. Eu quis, recatada e triste, sentir um
além daquilo que eu sabia. E em mim explodia uma harmonia que se fazia o avesso
de sua própria ordem. Uma harmonia que eu não notava e o meu corpo todo era
atravessado, era transgredido, era revirado. E no meu corpo inteiro os pássaros
cantavam, as cores inundavam e tudo transbordava.