Há em alguns dias um cansaço inevitável, quase como uma preguiça de
viver. Uma morte, bem pequena e suave, se viesse não encontraria resistência.
No meu corpo eu criaria o necessário para morrer no que fosse inevitável e para
extravasar o que em mim não se movesse. Nesses dias de cansaço inevitável cada
passo é de uma força tão cruel que a vida se abstém das suas marcas e
multiplica em fragmentos tudo aquilo que não vem. De cada letra puxo o fio que
lhe dá forma e, lentamente, não consigo mais me ler. A morte, então, não me
parece o fim de nada e diante dela já não posso me abster. Meu corpo encontra
um prazer esquivo e inaceitável na imobilidade em que o teto se contém. É
nesses dias que me perco sem ter volta... e quando volto não sou mais eu, não
sou ninguém.
Do que transborda
segunda-feira, 8 de junho de 2015
terça-feira, 26 de agosto de 2014
Um
fio solto em um emaranhado. Absorvido, apropriado. Era uma vez uma cortina
separando todo um quarto. Era uma vez um apartamento que abrigava as palavras.
E uma vez aconteceu de as janelas se quebrarem. E aconteceu da ventania tomar
conta da cidade. O apartamento era a cidade em sua infinita transparência.
Devagarinho as paredes escorriam pelo ralo. A mochila deslocada revelava seu
segredo: nada dentro dela, nada caberia. É importante que seja dito que um
único instante é o suficiente. Em um único instante as narrativas criam laços,
criam fendas, se condensam e extrapolam os limites. Do instante escolhido na há
verbo que dê conta de contar o seu caminho. No instante em que se cria o
possível, o impossível aparece em desalinho. E não há boca e nem letra que
supere o precipício.
domingo, 24 de agosto de 2014
Outra noite de ardência e solidão quieta. É importante sentir a presença
que se opera em um dia em que o mundo faz silêncio. Eu sozinha admito que o
calor é indispensável, mas advogo sem ressalvas que é preciso vez em quando se
esfriar. É preciso ser capaz de se envolver suavemente com os próprios
pensamentos, sem buscar a intercessão de alguém ou de alguma coisa que lhe
interrompa ou lhe absolva de sua criação. Todo dia acredito que eu sou-me
responsável e, por consequência disso, eu me responsabilizo por aquilo que
acredito. Apesar das minhas crenças e inteiramente nelas me permito duvidar e
ser sozinha, eu me permito me afastar quando me sinto impossível e assumo as
consequências da distância que transmito.
terça-feira, 19 de agosto de 2014
Nunca entenderam minha solidão. Julgaram com frieza a minha distância
necessária e concluíram que eu era indiferente. Nunca entendi minha solidão.
Julguei, precipitada, que precisava de espaço e de tempo quando tudo em mim se
desmanchava. Eu nunca soube como fazer para falar. Era preciso um pouco mais de
ar e de coragem. Encontrei nos muros, nas paredes e nos tetos a poesia
necessária e escondida. Derrubei o que era de concreto para poder criar uma
outra ordem. E eu me vi delineando palavras sem sentido. Nessa outra ordem que
criei não havia coerência e, devagar, eu percebi que nem sequer ordem havia. E
de repente a solidão se transformava em outra coisa.
sábado, 14 de junho de 2014
Era um corpo ainda feto, nem nascido, inacabado. Era um corpo
esparramado pela cama, pelo teto, pelo quarto. Era um corpo meio vivo, que
crescia, que brotava. Um corpo todo remendado, que agregava, transgredia. E era
um corpo que sentia, que sabia, interrogava. Um corpo meio amolecido,
endurecido, um emaranhado. E era esse corpo infinito, expandido, atravessado. E
uma pergunta, lá de longe, insistia em acontecer: “Com quantas palavras se faz
um corpo?”.
terça-feira, 7 de janeiro de 2014
Escuro da noite. Pulsante silêncio. Palavras
derretidas me inundam, não escorrem, endurecem no meu corpo. Aprisiono-me no
opaco e no invisível. Já não pressinto o que de longe me assoma. E é impossível
que alguém ainda exista, que persista nesse branco que me assombra. E é
impossível que o mundo ainda gire, agora que na casa as paredes não se
encontram. Eu não sei mais dizer do que preciso, depois que em cada rua os meus
passos se perderam. Depois que voltou tudo, lentamente, sem contorno. Depois
que qualquer coisa se tornou prova incontestável... Ainda sim, contestei sem
piedade. Precisava era me ver localizada. Localizar-me em algum canto em coerência.
Mas tudo em mim explode em cores vivas. E eu já não sei o que fazer com o movimento.
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